Por que pessoas com obesidade tendem a ter diabetes? Estudo explica | Brazil News Informa
Um grupo liderado por pesquisadores da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) demonstrou como o excesso de leptina, substância produzida no tecido adiposo e conhecida como hormônio da saciedade, atua em um tipo de célula imune e contribui para o desenvolvimento de distúrbios metabólicos, como obesidade e diabetes.
Publicado na revista Diabetes, o estudo abre caminho para o desenvolvimento de terapias que possam ajudar pessoas acometidas por essas condições.
"Colocamos camundongos que não respondem à leptina em uma dieta que os deixa obesos. Em comparação aos animais [sensíveis à leptina] normais submetidos à mesma dieta, eles eram mais saudáveis: tiveram melhor controle de glicose, glicemia e insulina", explica Lauar de Brito Monteiro, primeira autora do estudo realizado durante seu doutorado no Instituto de Biologia (IB-Unicamp) com apoio da FAPESP.
Monteiro realizou parte das análises durante estágio no Instituto Max Planck de Epigenética e Imunobiologia, em Freiburg, na Alemanha, também com bolsa da Fundação.
Para se certificar do papel das células imunes na interação com a leptina, os pesquisadores fizeram tanto experimentos in vitro, usando células, como em animais (in vivo).
Nos primeiros, eles analisaram macrófagos, um tipo de célula imune, isolados de camundongos que não expressam o receptor do hormônio em nenhuma parte do corpo.
Para as análises in vivo, estudaram camundongos que não expressam o receptor da leptina apenas nas células mieloides, envolvidas no processo inflamatório causado pela obesidade.
"Isso exclui os efeitos da leptina em células do sistema nervoso central, como neurônios, uma vez que esse hormônio também atua no cérebro sinalizando quando é hora de parar de comer. Com esses experimentos, mostramos como ela atua especificamente nas células imunes do tecido adiposo, onde a leptina é produzida. Em obesos, normalmente há um excesso desse hormônio e um processo inflamatório por conta disso", conta Pedro Moraes-Vieira, professor do IB-Unicamp e coordenador do estudo.
"O trabalho mostrou ainda que, num contexto não inflamatório, a leptina é muito importante. Ela atua no reparo tecidual, algo fundamental para o funcionamento do organismo e que ainda não é bem compreendido", completa.
A investigação foi apoiada pela FAPESP por meio de vários projetos, três deles coordenados por Moraes-Vieira (20/16030-0, 19/25973-8 e 15/15626-8).
Sinalização
Em células normais, os pesquisadores observaram que o contato com a leptina em um ambiente inflamatório faz com que seja secretada grande quantidade de moléculas (citocinas) que aumentam a inflamação. Nas células que não possuem receptor para o hormônio, não houve produção dessas citocinas.
"Os macrófagos do tecido adiposo estão num ambiente rico em leptina e, portanto, o hormônio não tem tanto efeito sobre eles. Em células de outras regiões com baixas concentrações de leptina, como da cavidade peritoneal [que envolve os órgãos abdominais], a susbstância se torna hiperinflamatória. Portanto, os macrófagos fora do tecido adiposo têm contribuição ainda maior para a inflamação sistêmica de baixo grau ocorrida na obesidade", afirma Monteiro, que atualmente realiza estágio de pós-doutorado no Sunnybrook Research Institute, afiliado à Universidade de Toronto, no Canadá.
O trabalho mostra que as alterações metabólicas nos macrófagos ocorrem por conta de disfunções na mitocôndria da célula, organela responsável pela produção de energia. Com a inflamação, a mitocôndria produz menos energia e mais radicais livres, que reduzem a funcionalidade do organismo.
Por trás de tudo isso está a chamada "via de sinalização celular mTOR", bastante estudada no contexto de outras doenças por seu papel regulador do metabolismo das células.
Os pesquisadores observaram que não só o chamado complexo 1 (C1) da mTOR é importante nesse processo, como já era conhecido na literatura especializada, mas que o complexo 2 (C2) tem um papel ainda maior do que se sabia na inflamação induzida pela leptina.
"Por isso, tratamos as células hiperinflamadas com uma droga que atua nessa via, usada para o tratamento de rejeição ao transplante de órgãos. A rapamicina, como é conhecida, inibiu o aumento excessivo da secreção de citocinas inflamatórias. Isso abre caminho para o desenvolvimento de tratamentos para doenças metabólicas como obesidade e diabetes", encerra Moraes-Vieira.
Assinam também a publicação pesquisadores do Instituto Max Planck, da Alemanha, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e do Laboratório Nacional de Biociências do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBio-CNPEM), em Campinas.
O trabalho teve apoio da FAPESP ainda por meio do Centro de Pesquisa em Obesidade e Comorbidades (OCRC) e de mais um auxílio concedido ao pesquisador do IB-Unicamp Alessando Farias.
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